domingo, 19 de janeiro de 2020

O rei do gado


No final da década de 1990, mais precisamente entre 1996 e 1997, foi transmitida uma telenovela intitulada “O Rei do Gado”. Um dos personagens na novela, o pecuarista Bruno Mezenga, tinha por hábito fazer as contas de despesas e investimentos sempre transformando os valores em equivalência com cabeças de gado. Isto se tornou uma das marcas do personagem.

Esta é uma prática que, embora possa parecer satírica, deve ser considerada e analisada por muitas pessoas que não sabem o valor do dinheiro. Um pai pode ensinar para o filho quantos dias de trabalho ele tem que ter para poder comprar isto ou aquilo para ele. Na mesma linha de pensamento os contribuintes podem e devem fazer estas equivalências para avaliar a aplicação dos recursos públicos por parte de nossos representantes.

É claro que muitas pessoas possuem a noção clara das ações e dos recursos públicos que são dispendidos, porém muitas outras pessoas podem ser ludibriadas pelos agentes políticos e acreditarem que os recursos públicos estão sendo bem aplicados.

Para compreender o escopo da análise temos que lembrar, sempre, das diversas reportagens que assistimos, ouvimos ou lemos sobre falta de medicamentos e médicos nos postos de saúde, sobre a infraestrutura deficitária da educação, sobre a falta de transporte, de segurança e de emprego em muitos municípios brasileiros. Sem falar que, na maioria das vezes, estas demandas reprimidas contrastam com o desperdício de dinheiro público em outras áreas ou mesmo com desvios destes.

Portanto, os cidadãos devem estar sempre vigilantes acerca da forma com que os agentes políticos aplicam os recursos públicos, pois temos a clareza de que as receitas são realizadas quase que integralmente. Desta forma, se as receitas previstas ocorrem normalmente, as despesas estimadas também devem ocorrer sem contingências ou cortes. Isto sem falar que os cidadãos devem participar ativamente, opinando sobre a elaboração do orçamento público.

Mas na prática não é isto que acontece. Do lado das receitas elas ocorrem, sim, sem problemas. Porém do lado das despesas podemos verificar que o caráter discricionário dos agentes políticos distorce as prioridades estabelecidas inicialmente e redirecionam os recursos de certas áreas para despesas de interesse deles e de seus grupos políticos, compostos por um conjunto de apaniguados e puxa-sacos.

Não é difícil de constatar isto na prática, basta calcular o percentual do orçamento executado para algumas funções e subfunções. Em muitos municípios e até mesmo em muitos estados e na União iremos verificar que o orçamento executado em relação ao inicialmente previsto para funções como agricultura, assistência social, segurança pública e trabalho não atingem 80% do valor previsto. Com isto, a diferença é remanejada para áreas de interesse dos agentes políticos.

Os cidadãos devem fazer como o Rei do Gado, relativizar os gastos público. Em outras palavras, os cidadãos quando se depararem com alguma despesa diferente do comum devem transformar o valor desta despesa em medicamentos para pressão arterial ou diabetes que poderia estar disponível para a população, em números de médicos que poderiam ser contratados mensalmente para atender nos postos de saúde, em materiais escolares de qualidade para os alunos da rede pública, e por aí afora.

O que não podemos é ver o dinheiro público ser gasto com despesas não tão prioritárias diante de tantas carências existentes. Depois que os agentes políticos atenderem todas as necessidades da sociedade, daí sim eles podem agir com discricionariedade com os recursos públicos. Mas sempre com responsabilidade e sem usar para promoção pessoal.



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